Fernão Capelo Gaivota
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"E então um homem disse, Fala-nos do Auto-conhecimento.
E ele respondeu, dizendo:
Os vossos corações conhecem em silêncio os segredos dos dias e das noites.
Mas os vossos ouvidos anseiam pelo som do conhecimento do vosso coração.
Vós sabeis por palavras aquilo que sempre soubestes em pensamento.
Tocais com a ponta dos dedos o corpo nu dos vossos sonhos.
E ainda bem que assim é.
A nascente oculta da vossa alma deve erguer-se e correr a murmurar para o mar, e o tesouro das vossas profundezas infinitas será revelado perante os vossos
olhos.
Mas que não haja medidas para pesar o vosso tesouro desconhecido;
E não procureis as profundezas do vosso conhecimento com limites.
Pois o ser em si não tem limites nem medidas.
Não digais "Encontrei a verdade", mas antes "Encontrei uma verdade."
Não digais "Encontrei o caminho para a alma", mas antes "Encontrei a alma a seguir o meu caminho''.
Pois a alma percorre todos os caminhos.
A alma não percorre uma linha, nem cresce como um caniço.
A alma desvenda-se a si própria como um lotus de incontáveis pétalas.
Por Kahlil Gibran em "O Profeta""
Anjo acordando o profeta ELIAS -óleo sobre tela de Juan Antonio de Frias e Escalante
"«Dais muito pouco quando estais a dar o que vos pertence.
Só quando vos dais a vós próprios é que estais verdadeiramente a dar.
Pois o que são as vossas pertenças senão aquilo que guardais com medo de necessitar amanhã?
E amanhã, que trará o amanhã ao cão prudente que vai enterrando ossos na areia sem marcas enquanto segue os peregrinos até à cidade santa?
E o que é o medo da necessidade senão a própria necessidade?
Não é o receio da sede que sentis quando o vosso poço está cheio, da sede insaciável?
Há aqueles que dão pouco do muito que têm, e fazem-no para conseguirem reconhecimento e o seu desejo oculto torna as suas dádivas sem valor.
E há aqueles que, tendo pouco, tudo dão.
Esses são os que acreditam na vida e na magnificência da vida e o seu cofre nunca está vazio.
Há aqueles que dão com alegria, e essa alegria é a sua recompensa.
E há aqueles que dão com dor e essa dor é o seu baptismo.
E há aqueles que dão e não conhecem a dor ao dar, nem procuram alegria, nem dão para se sentirem virtuosos; Dão, tal como no vale a murta exala o seu perfume para o espaço.
E através das mãos desses que Deus fala, e por detrás dos seus olhos que Ele sorri para a terra.
É bom dar quando vos é pedido, mas é melhor dar se vos pedirem só através da compreensão; E para o que tem as mãos abertas a busca daquele que vai receber é uma alegria maior do que dar.
E que podereis conservar?
Tudo o que possuís será um dia dado.
Por isso dai agora, agora que a época da dádiva pode ser vossa e não dos vossos herdeiros.
Dizeis muitas vezes "Eu daria, mas só a quem o merecesse".
As árvores do vosso pomar não dizem isso, nem os rebanhos nas pastagens. Eles dão para poder viver, pois não dar é perecer.
Aquele que é merecedor das suas noites e dos seus dias é com certeza merecedor de tudo.
E aquele que mereceu beber do oceano da vida merece encher a taça no vosso ribeiro.
E que deserto maior haverá do que aquele que assenta na coragem e na confiança de receber?
E quem sois vós para que os homens se desnudem e exponham o seu orgulho, para que os possais ver nus e com o orgulho a descoberto?
Certificai-vos primeiro de que sois dignos de dar e de ser instrumento da dádiva. Pois, na verdade, é a vida que dá à vida, enquanto vós, que vos considerais dadores, não passais de testemunhas.
E vós, os que recebeis – e todos recebeis – não carregueis o fardo da gratidão, pois estareis a colocar um jugo sobre vós e sobre aquele que dá.
Erguei-vos antes juntamente com o que dá, sobre essas dádivas como se elas fossem asas; Porque ter demasiada consciência da vossa dívida é duvidar da generosidade daquele que tem a terra de coração livre como mãe e Deus como pai.»
excerto do livro O Profeta" Kahlil Gibran
o
"No jardim de um hospital psiquiátrico conheci um jovem formoso de rosto pálido e encantador...
Sentando-me a seu lado num banco, perguntei-lhe:
- Porque estás aquí?
Olhando-me, com estranheza, disse:
- Essa é uma pergunta pouco própria, mas, de qualquer modo, responderei.
Meu pai quis fazer de mim uma cópia dele; o mesmo ocorreu com o meu tio. Minha mãe queria que fosse igual ao seu pai. Minha irmã apontava o seu esposo, oficial da marinha, como o modelo de perfeição a seguir. Meu irmão, excelente atleta, pensava que eu devia ser como ele.
E também os meus professores, de filosofia, de música, de matemática, me incitavam a ser um reflexo deles num espelho.
Por isso vim para aqui. Parece-me mais saudável. Pelo menos poderei ser eu mesmo.
De repente, voltou-se para mim, e disse:
Diz-me tu, agora. Vieste parar a este lugar guiado pela educação e pelos bons conselhos?
Eu respondi:
- Não, sou só um visitante.
Então ele disse:
- Ah!!!. És um daqueles que vive no manicómio, mas, do outro lado do muro?
Khalil Gibran
Dos Filhos
(...) E uma mulher que carregava o filho nos braços disse: “Fala-nos dos filhos.”
E ele disse:
Vossos filhos não são vossos filhos.
São filhos e filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E, embora vivam convosco, a vós não pertencem.
Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos,
Pois eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Pois suas almas moram na mansão do amanhã, que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.
Podeis esforçar-vos por ser como eles, mas não procureis faze-los como vós,
Porque a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados.
Vós sois o arco dos quais vossos filhos, quais setas vivas, são arremessados.
O Arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com Sua força para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe.
Que vosso encurvamento na mão do Arqueiro seja vossa alegria:
Pois assim como Ele ama a flecha que voa, ama também o arco, que permanece estável.
Kahlil Gibran
Então, uma mulher disse: “Fala-nos da alegria e da tristeza.”
E ele respondeu:
“ A Vossa alegria é vossa tristeza desmascarada.
E o mesmo poço que dá nascimento a vosso riso foi muitas vezes preenchido com vossas lágrimas.
E como poderia não ser assim?
Quanto mais profundamente a tristeza cavar suas garras em vosso ser, tanto mais alegria podereis conter.
Não é a taça em que verteis vosso vinho a mesma que foi queimada no forno do oleiro?
E não é a lira que acaricia vossas almas a própria madeira que foi entalhada à faca?
Quando estiverdes alegres, olhai no fundo de vosso coração, e achareis que o que vos deu tristeza é aquilo mesmo que vos está dando alegria.
E quando estiverdes tristes, olhai novamente no vosso coração e vereis que, na verdade, estais chorando por aquilo mesmo que constituiu vosso deleite.
Alguns dentre vós dizeis: ‘A alegria é maior que a tristeza’, e outros dizem: ‘Não, a tristeza é maior.
’Eu, porém, vos digo que elas são inseparáveis.
Vêm sempre juntas; e quando uma está sentada à vossa mesa, lembrai-vos de que a outra dorme em vossa cama.
Em verdade, estais suspensos como os pratos de uma balança entre vossa tristeza e vossa alegria.
É somente quando estais vazios que estais em equilíbrio.
Quando o guarda do tesouro vos suspende para pesar seu ouro e sua prata, então deve a vossa alegria e a vossa tristeza subir ou descer.”
Khalil Gibran
O seu nome completo é Gibran Kahlil Gibran. Assim assinava em árabe. Em inglês, preferiu a forma reduzida e ligeiramente modificada de Khalil Gibran. É mais comumente conhecido sob o simples nome de Gibran.
1883 - Nasceu em 6 de janeiro, em Bsharri, nas montanhas do Líbano, a uma pequena distância dos cedros milenares. Tinha oito anos quando, um dia, um temporal se abate sobre sua cidade. Gibran olha, fascinado, para a natureza em fúria e, estando sua mãe ocupada, abre a porta e sai a correr com os ventos.
Quando a mãe, apavorada, o alcança e repreende, ele lhe responde com todo o ardor de suas paixões nascentes: "Mas, mamãe, eu gosto das tempestades. Gosto delas. Gosto!" (Um de seus livros em árabe será intitulado Temporais).
1894 - Emigra para os Estados Unidos, com a mãe, o irmão Pedro e as duas irmãs Mariana e Sultane. Vão morar em Boston. O pai permanece em Bsharri.
1898/1902 - Vota ao Líbano para completar seus estudos árabes. Matricula-se no Colégio da Sabedoria, em Beirute. Ao diretor, que procura acalmar sua ambição impaciente, dizendo-lhe que uma escada deve ser galgada degrau por degrau, Gibran responde: "Mas as águias não usam escadas!"
1902/1908 - De novo em Boston. Sua mãe e seu irmão morrem em 1903. Gibran escreve poemas e meditações para Al-Muhajer (O Emigrante), jornal árabe publicado em Boston. Seu estilo novo, cheio de música, imagens e símbolos, atrai-lhe a atenção do Mundo Árabe. Desenha e pinta numa arte mística que lhe é própria. Uma exposição de seus primeiros quadros desperta o interesse de uma diretora de escola americana, Mary Haskell, que lhe oferece custear seus estudos artísticos em Paris.
1908/1910 - Em Paris. Estuda na Académie Julien. Trabalha freneticamente. Freqüenta museus, exposições, bibliotecas. Conhece Auguste Rodin. Uma de suas telas é escolhida para a Exposição das Belas-Artes de 1910. Nesse ínterim, morrem seu pai e sua irmã Sultane. 1910 - Volta a Boston e, no mesmo ano, muda-se para Nova York, onde permanecerá até o fim da vida. Mora só, num apartamento sóbrio que ele e seus amigos chamam As-Saumaa (O Eremitério). Mariana, sua irmã, permanece em Boston. Em Nova York, Gibran reúne em volta de si uma plêiade de escritores libaneses e sírios que, embora estabelecidos nos Estados Unidos, escrevem em árabe com idênticos anseios de renovação. O grupo forma uma academia literária que se intitula Ar-Rabita Al-Kalamia (A Liga Literária), e que muito contribuiu para o renascimento das letras árabes. Seus porta-vozes foram, sucessivamente, duas revistas árabes editadas em Nova York: Al-Funun (As Artes) e As-Saieh (O Errante).
1905/1920 - Gibran escreve quase que exclusivamente em árabe e publica sete livros nessa língua: 1905, A Música; 1906, As Ninfas do Vale; 1908, Espíritos Rebeldes; 1912, Asas Partidas; 1914, Uma Lágrima e um Sorriso; 1919, A Procissão; 1920, Temporais. (Após sua morte, será publicado u m oitavo livro, sob o título de Curiosidades e Belezas, composto de artigos e histórias já aparecidas em outros livros e de algumas páginas inéditas).
1918/1931 - Gibran deixa, pouco a pouco, de escrever em árabe e dedica-se ao inglês, no qual produz também oito livros: 1918, O Louco; 1920, O Precursor; 1923, O Profeta; 1927, Areia e Espuma; 1928, Jesus, o Filho do Homem; 1931, Os Deuses da Terra. (Após sua morte serão publicados mais dois: 1932, O Errante; 1933, O Jardim do Profeta.) Todos os livros em inglês de Gibran foram lançados por Alfred A. Knopf, dinâmico editor norte-americano com inclinação para descobrir e lançar novos talentos. Ao mesmo tempo em que escreve, Gibran se dedica a desenhar e pintar. Sua arte, inspirada pelo mesmo idealismo que lhe inspirou os livros, distingue-se pela beleza e a pureza das formas. Todos os seus livros em inglês foram por ele ilustrados com desenhos evocativos e místicos, de interpretação às vezes difícil, mas de profunda inspiração. Seus quadros foram expostos várias vezes com êxito em Boston e Nova York. Seus desenhos de personalidades históricas são também célebres.
1931 - Gibran morre em 10 de abril, no Hospital São Vicente, em Nova York, no decorrer de uma crise pulmonar que o deixara inconsciente.